segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Adão e Eva no Japão

Algumas palavras sobre O segredo das águas (Futatsume no mado, literalmente “A segunda janela”), de Naomi Kawase, que acaba de lançar Vision 

Na ilha japonesa de Amami*, onde prevalecem as tradições xintoístas, de significativa relação com as forças da natureza, vivem Kyoko e Kaito, dois jovens adolescentes prestes a entrar na vida adulta.
Como no mito bíblico, é a garota, Kyoko, que incita o rapaz ao conhecimento, à descoberta do amor, ainda que o primeiro sinal da “queda do paraíso” seja percebido pelo rapaz: a visão, na praia, do cadáver de um homem tatuado. O que o transtorna e o inquieta – a vida e a morte – é mais bem aceito pela menina, que sabe serem essas forças impossíveis de controlar. Ela mesma, filha do que consideram uma espécie de deidade, tem de aprender a lidar com a iminente morte da mãe (porque no xinto, tudo tem seu tempo sobre a terra e nem os deuses duram para sempre).
O mar é como um dos protagonistas da trama: é o nascimento, a morte, o desejo, a aversão. Não à toa, Kaito tem medo dele, porque ele é algo vivo que pode levá-lo ao ponto mais desconhecido de si mesmo. E isso é relembrado no mais belo diálogo do filme, em que Kyoko, contestando a repulsa do rapaz às águas, lhe diz algo como: “Mas eu também sou uma coisa viva”.



* o nome parece remeter a uma deusa xintoísta

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