sábado, 24 de novembro de 2018

Dois poemas para o futuro


CALMA E FUGA

lendo cruzo a avenida
pensando no poema
que fala de uma mulher livre
e de um homem feito dardo
que ela atira para longe de si

a tarde morna já se despede
e tudo parece tecido
em fios de ausência e desespero
enquanto os mortos de hoje
juntam-se aos corpos de ontem

fingimos calma, somos fuga
e ninguém sabe bem em que esquina
a conversa falhou e deixou
essa lembrança sem margens
nos olhos, nos ossos, no vento




LUGAR

um país
é descoberto
a cada manhã

a cada manhã
um mesmo país
se descobre

e chove forte
sobre o território
indefeso

todo dia
um país é tragado
em seus lençóis

e os dias passam
úmidos e tristes
sob a terra fértil

à espera do sol
que o evapore
e invente

(Tarso de Melo, Alguns rastros: uma antologia. Goiânia, Ed. Martelo, 2018)

Um comentário: