Já conhecia bem a sua parte – seu quarto. Nele, deitava-se agora na cama, pois, após experimentar todo o chão e demais reentrâncias, achou que a cama (sob a qual permaneciam imóveis os livros com manchas amarelecidas não porque velhos, mas porque mofavam tão logo entravam naquele cômodo ou em qualquer outro daquela casa) era o melhor que lhe caía. Bastava perambular com os olhos para entender que atrás da cômoda se apinhavam teias de aranhas poeirentas porque nunca limpavam ali, e tampouco eram retirados do lugar os objetos que repousavam sobre ela: os porta-retratos, dispostos estranhamente, cujas fotografias antigas se escondiam umas atrás das outras, a caixa de prata já preta que não continha jóias, mas pedaços de bijuterias estragadas, papeizinhos e um rosário em desuso. A caixinha escurecia, como tudo que de prata fosse em seu corpo.
Sobre a bicicleta ergométrica sedentária, ao canto, amontoavam-se as roupas limpas, mas nunca passadas a ferro, que ninguém passava roupa naquela casa. Não as guardava no armário, que seria inútil ter de tirá-las de dentro dele para que fossem novamente usadas. Ao lado do guarda-roupa se formava um vão onde cabia o velho violão sem cordas e, se mexesse ali, aí sim veria com nitidez a poeira alçando voo para se depositar no umbral da janela, fazendo-a, ao longo do tempo, emperrar como sempre. Através de seu vidro era possível ver as manchas gordurosas dos dedos antes limpos como o resto do corpo que agora jazia sobre a cama. Todas essas coisas entulhadas davam-lhe a impressão de que, embora o movimento fosse ínfimo, seria certamente acompanhado de uma pausa. E devia haver um momento em que tudo para. Tinha certeza disso quando observava a inércia que se apossava de seus membros, um a um. Sequer erguia as mãos para algum gesto de desalento, o corpo não se mexia, exceto os olhos. Breve eles também cessariam o movimento inútil de vagar por esse lugar já tão conhecido, até a hora em que resolvessem tornar a se abrir.
Sobre a bicicleta ergométrica sedentária, ao canto, amontoavam-se as roupas limpas, mas nunca passadas a ferro, que ninguém passava roupa naquela casa. Não as guardava no armário, que seria inútil ter de tirá-las de dentro dele para que fossem novamente usadas. Ao lado do guarda-roupa se formava um vão onde cabia o velho violão sem cordas e, se mexesse ali, aí sim veria com nitidez a poeira alçando voo para se depositar no umbral da janela, fazendo-a, ao longo do tempo, emperrar como sempre. Através de seu vidro era possível ver as manchas gordurosas dos dedos antes limpos como o resto do corpo que agora jazia sobre a cama. Todas essas coisas entulhadas davam-lhe a impressão de que, embora o movimento fosse ínfimo, seria certamente acompanhado de uma pausa. E devia haver um momento em que tudo para. Tinha certeza disso quando observava a inércia que se apossava de seus membros, um a um. Sequer erguia as mãos para algum gesto de desalento, o corpo não se mexia, exceto os olhos. Breve eles também cessariam o movimento inútil de vagar por esse lugar já tão conhecido, até a hora em que resolvessem tornar a se abrir.
(Leila Guenther. O vôo noturno das galinhas. Ateliê Editorial, 2006.)
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