Se me
perguntassem do novo filme do diretor alemão Wim Wenders, Perfect Days, ambientado no Japão, eu responderia como Glória
Pires: “não sou capaz de opinar”. Estou demasiado dentro dele para julgar.
Transito nele com naturalidade. Viveria nele sem problemas. Talvez por
descender de alemães e de japoneses? Mas ocorre que também me sinto
completamente à vontade num de seus filmes americanos, sem ter nada de
americana: Paris, Texas, cujo
protagonista se recusa a falar e que, quando resolve fazê-lo, e de forma
eloquente, eu poderia dublar de cor; Paris,
Texas, onde eu compraria um terreno imaginário para construir uma casa que
não existe, só para poder ficar calada sem ter de dar explicações. O
protagonista de Perfect Days, responsável
pela limpeza de banheiros públicos, quase não fala, como o de Paris, Texas, embora também seja
eloquente. Wim Wenders conseguiu fazer um filme mais japonês que o próprio
Japão. Wim Wenders, que, com seu documentário Tokyo-Ga, deu a melhor explicação para o silêncio e o alheamento
japonês do pós-guerra. “O que você disse?”, pergunta meu companheiro em
determinado momento do longa. E eu não havia dito nada: ele é que tinha
confundido a voz de uma das personagens com a minha.
Em
tempos: dizem que nos antigos e silenciosos mosteiros zen-budistas japoneses,
onde quase todas as atividades eram realizadas em revezamento pelos monges,
apenas uma era executada pelo mais alto na hierarquia: a limpeza dos banheiros.