Graciliano
Ramos:
Falo
somente com o que falo:
com
as mesmas vinte palavrasgirando ao redor do sol
que as limpa do que não é faca:
de
toda uma crosta viscosa,
resto
de janta abaianada,que fica na lâmina e cega
seu gosto de cicatriz clara.
*
Falo
somente do que falo:
do
seco e de suas paisagens,Nordeste, debaixo de um sol
ali do mais quente vinagre:
que
reduz tudo ao espinhaço,
cresta
o simplesmente folhagem,folha prolixa, folharada,
onde possa esconder-se a fraude.
*
Falo
somente por quem falo:
por
quem existe nesses climascondicionados pelo sol,
pelo gavião e outras rapinas:
e
onde estão os solos inertes
de
tantas condições caatingaem que só cabe cultivar
o que é sinônimo da míngua.
*
Falo
somente para quem falo:
quem
padece sono de mortoe precisa um despertador
acre, como o sol sobre o olho:
que
é quando o sol é estridente
a
contrapelo, imperioso,e bate nas pálpebras como
se bate numa porta a socos.
(João Cabral de Melo Neto)
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