terça-feira, 21 de outubro de 2025

Entrelaçando culturas nos textos literários

Casa Guilherme de Almeida | 08 de Novembro de 2025 | 14h às 16h 

Com o Coletivo Escritoras Asiáticas & Brasileiras



Uma conversa com integrantes do coletivo Escritoras Asiáticas & Brasileiras sobre suas reinterpretações das formas literárias de origem asiática.

 

A atividade será realizada presencialmente na Casa Guilherme de Almeida (Rua Macapá, 187 - Sumaré, São Paulo).

 

Grátis. Para se inscrever, clique aqui.


 

Flavia Yumi Sakai é artista visual e haicaísta. Desde a infância, cultiva seu impulso criativo em uma busca contínua por expressão e identidade. Investiga a simplicidade e a força dos gestos mínimos, inspirada pela tradição do haicai e pela estética japonesa, sua cultura de origem. Acredita que contar histórias também acontece sem muitas palavras — através de formas, cores e pausas — como buscou explorar no livro O Tempo em uma Chawan, lançado neste ano em coautoria com Juliana Negrão.






 

Isabella Yoshimura é escritora e roteirista graduada em Cinema pela USP. Dirigiu o curta-documentário The Living Past em Chongqing (China) e produziu um podcast sobre a experiência pandêmica de moradores de São Paulo. Autora de Poemas surdos, seu livro de estreia na poesia, explora temas de identidade, memória e espiritualidade, unindo delicadeza e reflexão em narrativas que transitam entre o real e o imaginário.






 

Jung Lee é poeta e tradutora. Graduanda em Letras pela USP, é criadora do Kocolab, laboratório de tradução em língua coreana, além de organizadora e mediadora do Clube de Poesia Asiática.






 

Karen Kazue Kawana é doutoranda em Teoria e História Literária do IEL/Unicamp e autora das coletâneas de poemas Pequenas coisas (Bestiário) e eu acendi o fósforo (Ofícios Terrestres), da novela O homem do jardim (Urutau) e do pseudo-renga Cancioneiro da desilusão (Urutau). Traduziu obras de escritores japoneses como Osamu Dazai, Motojirô Kajii, Yuriko Miyamoto, Toshiko Tamura, entre outros. Faz parte dos grupos de pesquisa Pensamento Japonês: Princípios e Desdobramentos (USP) e Mulherando (Unicamp).






 

Leila Guenther é descendente de imigrantes japoneses e alemães. Formou-se em Letras pela Universidade de São Paulo. Publicou os livros de contos Partes homólogas (Reformatório) e O voo noturno das galinhas (Ateliê Editorial), e os livros de poemas Este lado para baixo (Peirópolis) e Viagem a um deserto interior (Ateliê Editorial), selecionado no Programa Petrobras Cultural e finalista do Prêmio Jabuti. Mantém o blog nalinhadavida.blogspot.com






 

Tieko Irii é artista visual, diretora de arte e escritora paulistana. Formada em cinema pela FAAP em 1988, trabalhou por 25 anos em publicidade e no audiovisual, com passagens por filmes como Os Matadores (1987), O Menino Maluquinho 2 (1998), Castelo Rá-Tim-Bum (1999), e séries como Retrato Falado (Rede Globo). Publicou três livros infantis antes de As ruas sem nome (Patuá, 2025), obra de caráter autobiográfico. Viveu no Japão entre 1989 e 1991, experiência que influenciou sua pesquisa sobre memória, diáspora, gênero e raça.

segunda-feira, 6 de outubro de 2025

Uma amarga canção do exílio

 


Acabo de ler, numa sentada, Cancioneiro da desilusão: um pseudo-renga (Urutau), de Karen Kawana. Quando ela se referiu a um “pseudo-renga”, eu ri, porque achei que era uma resposta à mensagem em que chamei meus tercetos de “pseudo-haicais”. No caso dela, penso em pseudo- no sentido enriquecedor que o prefixo agrega a palavras como pseudofruto – uma fruta que vem da parte acessória de uma flor. Um figo, um caju, um morango. Pois o renga é um poema japonês encadeado, coletivo, composto em estrofes de três e dois versos por vários participantes, muitas vezes de forma lúdica em grêmios de haicai. E o termo pseudo-renga, cunhado pela autora, se dá pelo fato de ele não ser escrito por múltiplos autores, mas apenas por Karen, e ter apenas um eu lírico, masculino, uma espécie de homo japonicus cuja trajetória (tão familiar para mim, que descendo de japoneses) é de um exílio circular e infinito, de quem, em direção ao oeste, chega por fim ao leste, ponto de partida e chegada. Esse eu lírico, no entanto, é também coletivo em seu sentido existencial, ao ecoar a trajetória do imigrante japonês que abandona um país onde não cabe mais (“os que deixei/ não queriam o diferente/ para os envergonhar”), vem para uma terra com a promessa ilusória de novas oportunidades (“lá há sabiás/ calor de dar inveja/ a este meu país”), tentando sem sucesso integrar-se (“aqui também me veem/ e não me compreendem”), e cujos descendentes, anos depois, refazem o caminho em sentido contrário, em busca, no Japão, também de novas oportunidades de desilusão (“fui meu chefe/ e meu próprio escravo/ sem qualquer lucro”). Nessa descrença o subtítulo encontra o título, uma vez que cancioneiro evoca a literatura mais tradicional da nossa melancólica língua portuguesa.

A terra natal deste imigrante – seu furusato –, tantas vezes motivo de idealização e de esperança dos que já nasceram aqui, se revela, no trajeto inverso dos dekasseguis, culminado de vergonha, tão inóspita e tão pouco acolhedora como o Brasil o foi. A impressão amarga do fracasso tem passagem de ida e volta (“de novo aqui/ mais uma vez pária/ outra vez só”). O homo japonicus carrega uma inadaptação que não pode esconder: no Brasil não é brasileiro e no Japão não é japonês; portanto, ele não conhece pertencimento. Isso o mantém sempre desterrado (“eu, não obstante/ continuo estrangeiro/ em toda parte”), porque seu ethos não o deixa sentir-se em casa nem dentro de si mesmo: sua mente e seu corpo cansados (“a dor do corpo/ horas vestindo máscaras/ sob as quais não sou”), que a custo nesta obra arrasta não por acaso no encadeamento do renga sem trégua, não encontra porto onde se ancorar, está em constante errância, deslocado. Em Cancioneiro da desilusão, o que há de imutável e permanente é justamente a diáspora: uma espécie de lugar entre, um intervalo eterno, um não-lugar, talvez o único que nos é permitido habitar.

 

(Leila Guenther)